O pianista e eu!
Garçom! O de
sempre....
Olho ao meu redor enquanto espero meu drink sentado no bar.
Quase que incógnito, o pianista solitário, dedilha uma linda canção.
No salão, casais conversando, trocando promessas de amor.
Alguns com os braços estendidos sobre a mesa, mãos sobrepostas.
Outros numa troca de olhares que nenhuma frase poderia exprimir o que
sentiam.
O drink chega, me distraio com o tilintar dos cubos de gelo no whisky.
Sorvo um gole, o primeiro do dia e da espera da chegada dela. Sim, ela.
Olho distante a mesa reservada para nós dois. Aconchegante e discreta, como
ela.
Passeio meus olhos na entrada do piano bar. A recepcionista entretida com os
clientes que acabam de chegar. Passa os dedos na lista de reserva e os conduz à
mesa destinada. Acompanho o trajeto. De mãos dadas, o casal segue a
recepcionista, ele na frente, ela meio que escondida logo atrás. Aguardando a
chegada, o maitre e dois garçons. Parece um cerimonial, um ritual de amor. Os
garçons puxam as cadeiras para o casal sentar-se quase que sincronizados. O
maitre logo após, com suave e profissional atitude, posta o menu à direita de
cada um.
Sorvo mais um gole. Esse mais longo. Meus lábios tocam nos gelos. Meus dedos
ficam frios como o copo. Novamente, olho para a recepção. Desta vez, vazia. Ninguém
chegou. Dou uma olhadinha discreta para o relógio. Trinta minutos do combinado
horário já se passaram. Penso comigo "coisas de mulher".
Garçom! Mais um. O de sempre.
Revejo as mesas com os casais. Já até me parecem familiares. E lá, na minha
mesa reservada, ainda vazia, imagino-a lindamente vestida, com uma postura
cheia de realeza. Não haveria ser de outra forma. Afinal, ela, minha
rainha.
Trocado o copo, sorvo mais um gole. Percebo a recepcionista me olhando com um
ar preocupado. Ela sabe quem espero. Somos um casal conhecido. A pontualidade
dela é conhecida por todos. E eu que sempre chego uma hora antes também é
sabido.
Parece que o relógio me aperta o pulso e confiro novamente as horas. Uma hora e
meio já se passou.
Garçom traga-me o telefone, por favor.
Chama e ninguém responde. Bom, penso eu, está a caminho. Percebo aos poucos
meus pseudos conhecidos casais irem embora. Aos poucos, o salão torna-se mais
imenso. Sorvo mais gole, e o drink se acaba novamente.
Garçom! Mais um.
Olho para a prateleira espelhada e me dou conta que já decorei todas as marcas
e posições de cada garrafa. Atrás delas, vejo meu reflexo um tanto quanto
perplexo. Sorvo mais um gole.
Ao longe, noto o pianista solitário. Não cansa de tocar a mesma canção. Ele
sabe quanto a amo. A canção e ela. Sorvo mais gole. Noto, agora, o salão vazio.
Minha mesa intacta, amordaçada, chorando em profundo desespero nossa
ausência.
Garçom! O último, por favor.
Convido o pianista a compartilhar comigo este derradeiro drink.
Bebemos juntos num silêncio absurdamente profundo.
Nós dois, os solitários desta noite.
O pianista e
eu.
Jorge LCF Lennon ®
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